domingo, 26 de abril de 2015

Dilemas da escola pública

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Por *Cláudia Santa Rosa

A essência do tema e das ideias deste texto publiquei num artigo do ano de 2009. Continua atualíssimo.
Tenho andado mesmo muito “azeda”. Na verdade, estou atravessando uma das fases de maior intolerância, porém, quase silenciosa, nesses 25 anos servindo à educação do meu Estado. Realmente, não é de hoje que acompanho os dilemas enfrentados
pela escola estatal, tanto é que alguns costumam dizer que comecei a “sofrer” jovem demais. A questão é tão séria que às vezes fico a pensar: do jeito que a roda gira, talvez os dilemas sejam meus e não da escola.
Ora, a escola pouco demonstra algum incômodo. Sou eu quem está cansada, cansadíssima, de ouvir grotescas promessas de gente que afirma: “a educação será prioridade no meu governo”. Trata-se de uma gente que promete aquilo cuja predisposição parece ser mesmo para não cumprir. É fato. À partida a escola enfrenta o dilema de ser diferente daquela dos discursos. Pobre de quem dela precisa, pobre de quem nela acredita.
Nesse contexto entram outros tantos dilemas. Ao longo de quase duas décadas, inventei de construir uma ideia de que, por exemplo, a escola deve ter data para começar e terminar o ano letivo; deve ter hora para começar e terminar o turno de atividades; que a semana deve ter pelo menos cinco dias letivos, exceto os dias feriados... Entendi de achar trivial a escola cumprir seus tempos; ter equipe, trabalho integrado, dispor de todos os professores necessários, aqueles mestres que dominam os conteúdos, sabem ensinar e aprender com os alunos.
Na escola que idealizamos um projeto de formação na cidadania, os encontros de estudos, planejamento, trocas e reflexões sobre a/na prática, assim como as reuniões entre professores e responsáveis pelos alunos, acontecem sem subtrair os dias letivos. Investi na construção de um cenário educacional permeado pelo diálogo, pelo respeito, pela valorização dos profissionais mais talentosos, cenário que dispensaria recorrer às greves e outros tipos de paralisações, por vezes decorrentes de quebras de acordos.
Até o final de 2014 trabalhei numa escola que tem Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) 5,7, o segundo mais alto entre as estaduais de Natal. Tenho a clara convicção de que estamos reprovados, no máximo em recuperação, mas dizem que tal IDEB é muito bom. O problema é a escola descobrir o que fazer para não descer degraus e, mais: continuar a subir, não obstante a tamanha descontinuidade e lacunas na equipe docente. Muitos aparecem e logo desaparecem, quando sabem sobre as regras de funcionamento da instituição, aliás, nada diferente de como deveriam ser as demais escolas.
Confesso: talvez eu fique frustrada pelo fato de a rejeição de alguns professores não ser pelos desafios de um projeto pedagógico diferenciado, e sim por ser uma escola que passa a ideia de ser exigente, de esperar que o profissional, efetivamente, trabalhe. O Estado adota práticas de proteção exemplar: esses “profissionais” se enquadram bem em outras escolas, em órgãos centrais, gabinetes. Que lástima! Agora, estamos diante de um dilema: insistir no que entendemos ser o certo ou afrouxar para harmonizar a equipe. Quando haverá concurso público com os candidatos a concorrerem por escola?
A gestão pública continua obsoleta, com baixa visão sobre o que deve ser prioridade. A escola não enfrenta dilemas, parece que os dilemas são meus.
*Professora, especialista em Psicopedagogia, Mestre e Doutora em Educação. Diretora Executiva do Instituto de Desenvolvimento da Educação (IDE) e Coordenadora do “Esquina do Conhecimento, projeto pedagógico da Escola Estadual Manoel Dantas. É articulista de temas relativos à Educação e no ano de 2014 passou a publicar, também, minicontos de amor, crônicas e poemas que são tentativas de incursão pelo universo do texto literário. (educadora@claudiasantarosa.com)

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